Até o Sol
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- 1 de fev. de 2024
- 15 min de leitura
Atualizado: 5 de jun. de 2024
Sinopse: Nada foi mais proclamado no mundo do que o amor. Tantas canções já foram compostas sobre este tema. Há séculos, o amor, é o motivo de harmonias e melodias, de paz e de guerras, de dor e de alegria. O teatro o tem celebrado, a literatura tem falado dele mais do que qualquer outro assunto, a música não seria a mesma sem ele e até a religião o traz como tema central. Este sentimento avassalador, ainda hoje, norteia a maior parte das relações humanas e já foi, inclusive, motivo de guerras devastadoras. O homem continua buscando por ele ainda que ele represente, muitas vezes, dor e sofrimento. Nossa história expõe o amor em uma de suas formas mais puras e desinteressadas. Amor, simplesmente.
Até os personagens, propositadamente, têm o nome mais simples possível, João e Maria, para que o foco não se torne outro a não ser, o amor que acontece, que nasce, que brota sem, muitas vezes, dar notícia da sua presença. Como não festejar tão nobre sentimento? "Até o sol" vai mexer com todos os leitores e revelar que, até do coração mais duro, é possível nascer empatia e identificação em algum nível com esta história.

ATÉ O SOL
—Maria, você vai se atrasar para a escola.
—Não vou, não! Eu vou correndo com o João.
O ano era o de 1940.
Ele, João.
Ela, Maria.
Naquela época, muitas escolas eram construídas nos arredores das fazendas locais que ficavam muito distantes da cidade. Elas eram feitas de madeira, com grandes janelas sem vidro, mas que podiam ser totalmente abertas para que entrasse o precioso ar matutino.
As aulas, neste tipo de escola, sempre aconteciam pela manhã, assim era costume ver pelas estradas a criançada feliz, logo cedo, rumando para a escola. Andavam todos saltitando.
Quase todos iam descalços e de calças curtas, alguns até de suspensórios.
Os mais abastados até iam de calçados, mas acabavam por voltar para casa sem sapatos, contagiados pela liberdade que andar descalço proporcionava e também para serem aceitos pela criançada.
Ali, os filhos dos fazendeiros, os filhos dos lavradores e funcionários das fazendas tinham o mesmo valor. Formavam uma grande família.
Cada escola tinha a sua tia, que era responsável por ensinar todas as disciplinas, que nem eram tantas como hoje em dia.
O mais importante era aprender a ler e a escrever. Isto era primordial.
Tinha tia gente boa e tia má. As más eram aquelas temidas. Toda criança colocava alho debaixo das axilas para fingir que estava com febre, só para não ir à escola. Nem sei se isto funciona mesmo.
Pobres dos alunos que pegassem uma tia má; rapidamente desanimavam de aprender e associavam o aprendizado àquelas tias más. Daí tava feito o estrago. Carregava-se isto para a vida toda.
Para as tias más dedicavam os desenhos mais terríveis do mundo.
Era comum encontrá-los em folhas jogadas no lixo, desenhos de um capeta de saia na frente da sala de aula, uma bruxa com uma vassoura nas mãos ensinando na lousa e outras coisas que não vale a pena mencionar.
Vez ou outra, o desejo de extravasar a raiva deste tipo de tia era tão grande, que alguns meninos não se continham e desenhavam nas paredes mesmo.
Outro dia, um menino fez um desenho muito artístico feito com carvão, de uma velha descabelada e com um único dente na boca. Do seu corpo saía umas ondinhas que entendíamos ser, o mal cheiro da professora.
A meninada não perdoava. Ria mesmo.
Por outro lado, as tias legais eram idolatradas. Estas seriam lembradas por toda a vida e continuariam ganhando maçãs toda manhã.
Há incontáveis exemplos de tias assim e até uma brincadeira que se faz com os mais velhos que é perguntar se eles se lembram do nome da primeira professora.
Muitas seriam lembradas pela sua gentileza, delicadeza e senso de humor e outras por serem tão odiosas que se tornaram inesquecíveis no pior sentido da palavra.
João e Maria tinham uma tia fantástica. Afetuosa e carinhosa.
Compreendia quando erravam e era incansável no ensinar. Lembrariam dela a vida toda.
Foi neste cenário de fazenda, de andar descalços nas estradas de terra, de correr livre que João e Maria se encontraram.
Eram excelentes amigos desde os seis anos de idade.
João preferia brincar com Maria do que com os outros meninos.



